A menina do lado de lá da parede, os seus vestidos,
não sentada, mas em repouso, a falar,
cinematograficamente desleixada,
com seu séquito fiel, as bonecas.
Amacia os teus lábios em segredo
quando o teu amor estiver à porta.
O silêncio confirmará a aceitação.
Fazia as várias vozes enquanto passava os dedos magros
nos cabelos longos e incertos.
As bonecas, quietas, em fila pela beira do colchão,
a mobília em cenário além rio.
Fazia as várias vozes.
Assim aprendemos a interpretar o silêncio.
Era uma menina pequena, o seu corpo não revelava
nada do que pensava conhecer das coisas com que se faz a vida.
Era uma menina, fechada na casa, do lado de lá da parede.
A parede, imagino-a fina, frágil, como a menina.
Eu oiço as vozes, sim.
As das bonecas.
Se a menina falava de amor, de que falavam as bonecas?
Os cabelos longos, espalhando-se pelos ombros.
As bonecas gostam de brincar com as bonecas,
ser senhoras grandes a fingir.
A menina a falar de amor e as bonecas
a empurrarem-se umas às outras da cama abaixo.
A menina espreita da janela.
Eu oiço um grito.
Abre-se a janela, chega um carro lá em baixo.
A voz da menina, diferente das vozes das bonecas
e da menina do lado de lá da parede, chama pela mãe.
Assim se reconhece a chegada.
Uma boneca caída no chão levanta a cabeça espantada.
Pode afirmar-se,
o espanto é a foz da desilusão.
As bonecas brincam com as bonecas,
a menina com os dedos magros nos cabelos longos,
baloiçando sobre os ombros, sai do quarto a falar de amor.
O corpo pequeno que sabe das coisas com que se faz a vida,
o passo muito curto pelo corredor.
Só resta o silêncio, sim.
As bonecas são agora só bonecas.
Oiço e já não oiço nada.
A menina do lado de lá do lado de lá
do lado de lá do lado de lá da parede.